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Tradicional mate gelado refresca banhistas e garante sustento de famílias na Baixada

Um dos fortes sentimentos de identidade dos santistas está ligado ao consumo do mate gelado, vendido em carrinhos e que quase sempre contam também com a oferta de suco de abacaxi ou a opção de mistura entre os dois.

Ao todo, a Cidade conta com 36 carrinhos espalhados por diversos cantos, como no Centro, na praia e na Vila Belmiro (em dia de jogo). E não tem como resistir à oferta dessa bebida gelada, principalmente nos dias de calor.

Os preços variam entre 6, 8 e 10 reais, a depender do tamanho do copo, que sempre requer o famoso “chorinho”, aquela quantidade a mais de chá para o comprador.

Mas o que para muitos santistas é um momento de refresco em dias de calor é também o ganha-pão desses mais de 30 ambulantes, que tiram do mate o sustento deles e da família. É o caso de Pedro Feitoza Neto, que conta viver da venda do chá há 35 anos, na praia da Aparecida.

“Eu vim de Souza, na Paraíba, para Santos e desde então estou na luta com o carrinho de mate e abacaxi. Criei meus filhos com o dinheiro do mate e hoje tenho mais três primos pela praia trabalhando nesta área”.

Cosme Alves do Santos vive da venda do mate desde 1992 e depois de muita insistência contou o segredo para o chá da praia ser mais gostoso do que o que fazemos em casa. “O segredo está no gelo. O chá é feito normalmente, temperamos, coamos, mas ao invés de colocar na geladeira, é no gelo que vai direto no carrinho”, diz baixinho, com as mãos no rosto, para que ninguém mais escute.

Já para o Arnaldo Felix Barros, que trabalha com o carrinho no centro da Cidade, em frente à Praça Visconde de Mauá, o melhor do mate santista é a mistura. “Muita gente me pede essa mistura que faz sucesso, do mate com o suco de abacaxi. Quem toma aprova”.

Mas afinal, de onde surgiu essa tradição de consumir o mate em Santos? Para isso, é necessário viajar um pouco no tempo, para entender como começou o consumo da bebida.

Os registros do cultivo da erva-mate no sul do Brasil pelos índios guaranis remontam do século 16, de acordo com o relato de colonos portugueses. Uma pesquisa feita pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) cita a lenda indígena para a origem da erva.

Segundo a tradição, ela teria surgido após o pedido de um velho pajé ao deus Tupã, como forma de recuperar a alegria perdida com a ausência da filha, que se casaria e consequentemente partiria com o marido, ficando longe do pai.

Um pajé desconhecido chegou à tribo e ofereceu uma erva, dando ao pajé local as orientações sobre como prepará-la. A alegria voltou para a vida dele após saborear o presente divino. “A nova bebida também passou a ser um símbolo de amizade entre os guerreiros, e confortava todos em horas tristes e de solidão”.

Mas, tanto os países vizinhos do sul da América, quanto os moradores do Rio Grande do Sul, onde fica a UFRGS, consomem o mate quente, em forma de chimarrão. O mate gelado conhecido no Paraguai, Bolívia, Mato Grosso do Sul e Paraná como Tererê possui a história de origem ligada a conflitos.

De acordo com o Instituto Histórico e Geográfico do Mato Grosso do Sul, o Tererê (chimarrão gelado) teria surgido em tradições de nativos locais, muito antes da invasão dos europeus ao continente. Mas existem relatos, sobretudo referentes à guerra do Chaco (entre a Bolívia e o Paraguai), de que as tropas começaram a beber mate frio para não acender o fogo, que denunciaria a presença das tropas ao inimigo e consequentemente poderia custar a vida de soldados.

Existe uma versão semelhante, mas ligada à Guerra do Paraguai. Nesse caso, o mate seria uma forma de paz, pois as tropas supostamente paravam o conflito para apreciar o Tererê.

No início dos anos 50, a erva virou sucesso no Rio de Janeiro. Não existem registros sobre quando ela passou a ser consumida nas praias cariocas, mas viraram uma febre na cidade nos anos dourados, com vendedores espalhados pelas praias e pelos arredores do estádio do Maracanã.

O sucesso se mantém até hoje, onde se vende o segundo melhor mate gelado do mundo, perdendo apenas para o de Santos (de acordo com… bem de acordo com qualquer santista, basta perguntar).

Conhecido por ocupar por mais de 50 anos o ponto de vendas da praia entre o canal 3 e a Avenida Conselheiro Nébias, Mamode Hassan, muito mais conhecido pelo seu apelido “Paraná”, faleceu, aos 87 anos, em 2002. E tamanho era o carinho da população por ele que teve sua história contada em todos os jornais da Cidade.

Esse amor não era à toa, Paraná foi quem trouxe o primeiro carrinho de mate para a Cidade. Chegou a Santos no ano de 1959 onde começou a vender a bebida na Praça dos Andradas e na esquina da Avenida Epitácio Pessoa com a Rua Oswaldo Cruz.

Ao longo dos mais de 50 anos de profissão, Paraná conseguiu criar os três filhos graças ao carrinho e inspirou diversas outras pessoas a vencerem da mesma forma, como Arnaldo, Cosme ou o Pedro, que ao venderem o delicioso chá gelado de Santos, mantêm vivo o legado do Paraná e a alegria dos santistas. Pois assim como a tribo que nunca mais conheceu a tristeza após tomar o mate, é difícil ver um santista triste ao saborear a tradicional bebida gelada.

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